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STJ: Notificação prévia é obrigatória para validade da ação de despejo imotivada

Apesar de não haver previsão legal expressa, a notificação prévia ao locatário sobre o encerramento do contrato de locação por denúncia vazia (ou imotivada) é elemento obrigatório para a validade da posterior ação de despejo. A única exceção à necessidade de notificação premonitória é o ajuizamento da ação de despejo nos 30 dias subsequentes ao término do prazo do contrato de locação.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que, em razão da não comprovação de notificação prévia ao locatário, declarou extinta uma ação de despejo.

Na ação, a proprietária afirmou que não tinha mais interesse no aluguel e, diante da resistência do locatário em desocupar o imóvel, pedia que ele fosse condenado a sair.

O juiz decretou a rescisão do contrato e deu 30 dias para a desocupação voluntária do imóvel, mas o TJMG extinguiu a ação por falta de notificação do locatário.

Inter​​pretação legal

Em recurso ao STJ, a locadora alegou que não há previsão legal expressa de que a notificação prévia seja indispensável para o ajuizamento da ação de despejo. Segundo a recorrente, a notificação premonitória é suprida pela citação do réu na ação judicial, momento a partir do qual ele pode desocupar o imóvel ou, dentro do prazo legal, apresentar defesa.

A ministra Nancy Andrighi, relatora, explicou que a controvérsia diz respeito à interpretação do parágrafo 2º do artigo 46 da Lei 8.245/1991. De acordo com o dispositivo, ocorrendo a prorrogação da relação locatícia, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo, concedido o prazo de 30 dias para desocupação.

Segundo a ministra, a jurisprudência do STJ sobre essa questão já apontava, ainda que de forma indireta, para o caráter indispensável da notificação premonitória ao locatário, inclusive com o uso de expressões como “necessária” e “obrigatória” em tais hipóteses.

Motivos​​ sociais

A relatora também mencionou entendimentos da doutrina no sentido da necessidade da notificação prévia na denúncia vazia do contrato com prazo indeterminado.

“Como corretamente apontado pela doutrina, a necessidade de notificação premonitória, previamente ao ajuizamento da ação de despejo, encontra fundamentos em uma série de motivos práticos e sociais, e tem a finalidade precípua de reduzir os impactos negativos que necessariamente surgem com a efetivação do despejo”, afirmou a ministra, lembrando que a própria doutrina excepciona a necessidade de notificação caso a ação de despejo seja ajuizada nos 30 dias subsequentes ao fim do prazo do contrato.

Ainda de acordo com Nancy Andrighi, a moderna doutrina do direito civil tem considerado a existência de um princípio – ou subprincípio – do aviso prévio a uma sanção, baseado na boa-fé objetiva, no contraditório e na ideia de vedação da surpresa.

“Sob essa perspectiva, também é obrigatória a ocorrência da notificação premonitória considerando os aspectos negativos que a ação de despejo pode implicar sobre aquele que deve ser retirado do imóvel”, finalizou a ministra.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

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Advocacia Direito Penal Legislação Novidades Processo Penal STJ

STJ concede habeas corpus a mais de mil presos de SP que cumprem pena indevidamente em regime fechado

Diante do reiterado descumprimento da jurisprudência das cortes superiores pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para fixar o regime aberto a todas as pessoas condenadas no estado por tráfico privilegiado, com pena de um ano e oito meses.

A medida – decidida p​or unanimidade – foi adotada também em caráter preventivo, para impedir a Justiça paulista de aplicar o regime fechado a novos condenados nessas situações.​

Segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, apresentados pela Defensoria Pública daquele estado, havia – em março – 1.018 homens e 82 mulheres cumprindo a pena mínima por tráfico em regime fechado, pois o TJSP – contrariando o entendimento do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) e ignorando direitos previstos em lei – não lhes autorizou o regime aberto, nem a substituição da pena.

Para o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, a insistente desconsideração das diretrizes normativas derivadas das cortes superiores, por parte das demais instâncias, “produz um desgaste permanente da função jurisdicional, com anulação e/ou repetição de atos, e implica inevitável lesão financeira ao erário, bem como gera insegurança jurídica e clara ausência de isonomia na aplicação da lei aos jurisdicionados”.

Jurisprudência cons​​olidada

O ministro afirmou que é consolidada e antiga a interpretação do STF de que não é crime hediondo o tráfico de drogas na modalidade prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006 – quando a quantidade de drogas apreendida não é elevada, o agente é primário, de bons antecedentes, não se dedica a delitos nem integra organização criminosa. Nessa situação, a pena pode ser reduzida em até dois terços, chegando ao mínimo legal de um ano e oito meses.

Segundo Schietti, em decorrência dessa interpretação, o STF já se pronunciou no sentido de que a natureza não hedionda do crime de tráfico privilegiado desautoriza a prisão preventiva sem a análise concreta dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal; afasta a proibição de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, prevista no artigo 44 da Lei de Drogas; e impõe tratamento penal mais benigno.

O ministro observou que, além da jurisprudência dos tribunais superiores sobre a matéria, a Lei 13.964/2019 deu nova redação ao artigo 112, parágrafo 5º, da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal), e dispôs que “não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/ 2006”.

No entanto, como apontou o relator, é costumeira a desconsideração pelo TJSP das Súmulas 718 e 719 do STF e da Súmula 440 do STJ, que espelham a mesma orientação jurisprudencial.

“O que se pratica, em setores da jurisdição criminal paulista, se distancia desses postulados, ao menos no que diz respeito aos processos por crime de tráfico de entorpecente na sua forma privilegiada, em que a proporcionalidade legislativa – punir com a quantidade de pena correspondente à gravidade da conduta, mas também na sua espécie e em seu regime de cumprimento – é desfeita judicialmente”, afirmou.

Dados preocu​​​pantes

Schietti lembrou que, em agosto, a Sexta Turma declarou a ilegalidade de uma decisão do TJSP em situação idêntica e pediu uma atuação mais harmônica das instâncias ordinárias em questões jurídicas pacificadas. Na ocasião, revelou-se que, dos 11.181 habeas corpus impetrados pela Defensoria Pública de São Paulo no STJ em 2019, a ordem foi concedida em 6.869 (61,43% das impetrações).

Para o ministro, esses dados são a tradução “inequívoca e indesmentível” de que o volume de trabalho das turmas criminais do STJ, ocupadas em mais de 50% por habeas corpus oriundos do TJSP – dos 68.778 habeas corpus distribuídos no STJ em 2019, 35.534 vieram de lá –, “em boa parte se resume a simplesmente reverter decisões que, contrárias às súmulas e à jurisprudência das cortes superiores, continuam a grassar, crescentemente, em algumas das 16 câmaras criminas daquele tribunal”.

Em seu voto, o relator criticou o aumento exponencial do encarceramento de pessoas sob a acusação de tráfico, cujo número aumentou 508% entre 2005 e 2017 apenas no estado de São Paulo, segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária.

O relator ainda destacou pesquisa do Instituto Conectas segundo a qual o estado de São Paulo é responsável por cerca de 50% das prisões por tráfico no país. O estudo concluiu que os juízes de primeira instância, em São Paulo, continuam aplicando tratamento desproporcional ao tráfico privilegiado, em comparação a outros delitos sem violência de igual pena.

Na avaliação de Schietti, isso contribui para “uma trágica realidade”: mesmo com o expresso reconhecimento de que não possuem antecedentes nem integram organização criminosa ou exercem atividade delitiva, mais de mil homens e mulheres permaneceram presos durante o processo, foram condenados à pena mínima prevista para o tráfico privilegiado – ou, quando muito, a uma pena menor que quatro anos de reclusão – e tiveram negado o direito de recorrer em liberdade. E, no julgamento da apelação, o TJSP não apenas confirmou a sentença condenatória, como também manteve o regime fechado e a proibição de substituição da pena.

Fundamentação ​​​​inidônea

O habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública de São Paulo foi em favor de um preso, com pedido de extensão a todos os demais nas mesmas condições. No caso individual, o réu foi denunciado por armazenar 23 pedras de crack (com peso líquido de 2,9g) e quatro saquinhos de cocaína (com peso líquido de 2,7g), supostamente para comércio ilícito. Ele foi condenado a um ano e oito meses de reclusão, no regime inicial fechado, mais multa.

O TJSP manteve o regime fechado com base na natureza das drogas, pois “quanto maior a capacidade de viciar da droga, em abstrato, maior a reprovabilidade”. Para Schietti, a fundamentação para manter o regime fechado não foi idônea, uma vez que a quantidade de drogas apreendidas não era relevante e o réu preenchia os requisitos para a caracterização do tráfico privilegiado – tanto que a pena foi fixada no mínimo legal.

Ao fixar o regime aberto em favor do paciente, o colegiado determinou a mesma providência para todos os presos que se encontrem em situação igual no estado e estejam no regime fechado, e também para todos os que forem condenados futuramente.

Em relação aos condenados por tráfico privilegiado com penas acima da mínima, mas menores que quatro anos de reclusão, os ministros determinaram que os juízes das Varas de Execução Penal reavaliem, com a máxima urgência, a situação de cada um, de modo a verificar a possibilidade de fixação do regime aberto em razão do desconto do tempo em que tenham permanecido em prisão preventiva.

Ponderação am​​pla

Na opinião do ministro Nefi Cordeiro, as situações narradas pela Defensoria Pública de São Paulo – bem precisas e delimitadas – não deixam dúvida de que é devida a incidência do regime mais brando, em razão da pena fixada. Ao acompanhar o relator, o ministro ressaltou que a “gravidade da repetição de feitos exige uma ponderação mais ampla do cabimento de medidas definidoras do direito por esta corte”.

O ministro Antonio Saldanha Palheiro disse que tem verificado a renitência de vários magistrados em seguir a letra da lei e a orientação da jurisprudência dos tribunais superiores. “Esse tipo de comportamento transborda a independência jurídica. Não é independência jurídica externar a sua opinião para o caso concreto, é simplesmente a afirmação de um posicionamento ideológico, independentemente da posição dos tribunais superiores – que têm o papel de unificar a jurisprudência para pacificar os conflitos”, declarou.​

A ministra Laurita Vaz destacou que o relator, em seu voto, fez uma análise profunda da situação para justificar a concessão do habeas corpus coletivo. Segundo ela, a concessão da ordem nessas condições deve ser delimitada por um critério objetivo, como no caso.

Para o ministro Sebastião Reis Júnior, a postura extremamente punitivista não tem sido suficiente para combater a criminalidade. “É absurda essa insistência totalmente injustificável das instâncias ordinárias em simplesmente ignorar precedentes já pacificados no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal e, sem qualquer fundamentação jurídica, insistir em teses há muito superadas”, afirmou.

Insistênc​​​ia hedionda​

Ao se manifestar durante o julgamento, o defensor público estadual Rafael Ramia Muneratti lembrou que esses casos vêm se repetindo em todo o país. “Infelizmente, diuturnamente, continuamos a nos deparar com decisões, tanto em primeiro grau quanto em segundo, de aplicação do regime fechado em razão da suposta hediondez do crime de tráfico de drogas privilegiado”, frisou. Para ele, não é viável continuar “inundando o STJ” com habeas corpus relativos a matérias já pacificadas.  

O subprocurador-geral da República Domingos Sávio da Silveira criticou a posição – frequentemente adotada no TJSP – de considerar que o tráfico privilegiado é crime hediondo. “Hedionda é essa jurisprudência, essa insistência em manter o corpo do pobre, do preto, do periférico nas masmorras do estado de São Paulo”, afirmou.​

Leia o voto do relator.

Fonte: STJ

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Advocacia Processo Civil STJ

STJ: Embargos de terceiro não se destinam a contestar protesto contra alienação de imóvel

Ainda que se admita o registro de protesto contra a alienação de bens na matrícula do imóvel, para dar publicidade ao fato de que alguém pode ter direitos sobre ele, a decisão judicial que autoriza o protesto não produz, de forma concreta, efeitos positivos ou negativos sobre direitos de terceiros interessados.

Por isso, na hipótese de protesto contra a alienação de imóvel, não são cabíveis embargos de terceiro para contestar o lançamento da informação no registro imobiliário, por ausência de um de seus pressupostos básicos: a determinação judicial de apreensão do bem.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que rejeitou embargos de terceiro opostos com o objetivo de cancelar protesto contra a alienação de um imóvel. Os embargos foram apresentados por uma empresa sob a alegação de que o protesto a impedia de registrar o bem em seu nome.

A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a recusa de registrar o imóvel em nome da empresa está no âmbito da atuação do oficial do cartório e não decorre da decisão judicial que deferiu o pedido de averbação do protesto na matrícula imobiliária – mero ato de publicidade “que não afeta a posse ou a propriedade de terceiro alheio ao procedimento”. Segundo a ministra, a decisão sobre o protesto não configura apreensão judicial passível de ser reformada por meio de embargos de terceiro.

O juiz de primeira instância extinguiu os embargos, sob o fundamento de ausência de interesse processual no seu ajuizamento. A sentença foi mantida pelo TJSP.

Nenhuma infl​​uência

No recurso especial, a empresa afirmou que o seu direito de posse e de propriedade sobre o imóvel estaria embaraçado pela averbação do protesto, situação que a impediria de obter o registro. Segundo a sociedade, não sendo parte no processo que originou o protesto contra a alienação do imóvel, ela teria interesse na oposição dos embargos de terceiro.

No entanto, a ministra Nancy Andrighi assinalou que o protesto, por si só, não é capaz de produzir qualquer influência sobre relações jurídicas próprias ou de terceiros – situação que se mantém no caso de protestos que buscam a ressalva em relação a determinados direitos, como no caso do protesto contra a alienação de bens.  

“Como o protesto não acrescenta nem diminui direitos do promovente ou de terceiros, a sua utilização contra a alienação de bens não terá o condão de obstar o respectivo negócio, tampouco de anulá-lo, pois apenas torna inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como que este alega – simplesmente alega – ter direitos sobre o bem ou motivos para anular eventual transação”, declarou a ministra.

Sem vantag​​em

De acordo com a relatora, o STJ entende que, no caso do protesto contra a alienação de bens imóveis, a publicação de edital pode não ser suficiente para garantir a efetiva publicidade, motivo pelo qual se estabeleceu que a averbação na matrícula do imóvel é mais eficaz.

Nancy Andrighi ressaltou que a averbação do protesto contra a alienação na matrícula do imóvel “não cumpre outro propósito senão o de dar a efetiva publicidade à manifestação de vontade do promovente, sem diminuir ou acrescentar direitos das partes interessadas, ou tampouco constituir efetivo óbice à negociação ou à escrituração da compra e venda”.

No caso dos autos, ela entendeu que os embargos de terceiro não são o procedimento adequado à satisfação da pretensão da empresa que deseja obter o registro da escritura de compra e venda.

“Por essa razão, a ocasional procedência do pedido formulado nos presentes embargos de terceiro não teria o condão de produzir nenhuma vantagem concreta, benefício moral ou econômico para a recorrente, razão pela qual é correta a conclusão do tribunal de origem pela ausência de interesse de agir, em decorrência da ausência do binômio utilidade-adequação”, concluiu a ministra.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

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Direito de Família STJ

Prisão civil não abrange devedor de alimentos de caráter indenizatório decorrentes de ato ilícito

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para revogar a prisão civil de um devedor de alimentos, em caso no qual a obrigação alimentar – de caráter indenizatório – foi imposta em decorrência de ato ilícito.

Para os ministros, a única hipótese de prisão por dívida admitida no ordenamento jurídico brasileiro é aquela relacionada à pensão alimentícia com origem no direito de família.

O colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que havia determinado a prisão do devedor em razão do não pagamento da obrigação alimentar aos filhos de uma mulher vítima de homicídio cometido por ele.

Segundo a defesa, o réu cumpre pena pelo homicídio, já em regime aberto, e teve seus bens bloqueados para garantir a execução da sentença proferida em ação de indenização por danos morais. Contudo, por não verificar comprovação do pagamento integral da obrigação alimentar, o TJPR determinou a prisão civil.

Regra específica

A relatora do habeas corpus no STJ, ministra Isabel Gallotti, explicou que os alimentos, de acordo com a origem, podem ser classificados em três espécies: legítimos (devidos por força de vínculo familiar, estabelecido em lei), voluntários/negociais (derivados de negócio jurídico) ou indenizatórios (em razão de ato ilícito).

Segundo ela, os alimentos decorrentes de ato ilícito são considerados de forma expressa pelo Código Civil como indenização. A discussão no caso, ressaltou, é saber se o rito prescrito no artigo 528 do Código de Processo Civil (CPC) – que estabelece a possibilidade de prisão em caso de não pagamento injustificado da pensão – tem aplicação na execução de sentenças indenizatórias de ato ilícito.  

A ministra apontou que a questão não tem unanimidade na doutrina, mas parte expressiva dos juristas sustenta que somente no caso das obrigações de direito de família é que se torna possível a prisão civil do devedor de alimentos. Esse entendimento – afirmou Gallotti – é corroborado pela compreensão de que o CPC, em seu artigo 533, apresenta regra específica destinada a reger a execução de sentença indenizatória que inclui prestação de alimentos, a qual não pode ser alargada.

Obrigações distintas

De acordo com a ministra, alguns doutrinadores ressaltam que o artigo 528 do CPC não faz diferença entre a obrigação alimentar de direito de família e a decorrente de ato ilícito.  Para a relatora, no entanto, “é manifesta a distinção entre a obrigação de prestar alimentos derivada de vínculo familiar e a decorrente da condenação a compor os prejuízos causados por ato ilícito”.

Isabel Gallotti lembrou que os alimentos indenizatórios são arbitrados em quantia fixa, pois são medidos pela extensão do dano, de forma a propiciar, na medida do possível, o retorno da vítima à situação anterior ao ato ilícito. Ao contrário – observou –, os alimentos do direito de família devem necessariamente levar em consideração o binômio necessidade-possibilidade para a sua fixação, estando sujeitos à reavaliação para mais ou para menos, a depender das instabilidades ocorridas na vida dos sujeitos da relação jurídica.

Direito fundamental

“Considero que, embora nobre a intenção do intérprete, e sem descurar da possível necessidade do credor dos alimentos indenizatórios, não é dado ao Poder Judiciário ampliar as hipóteses de cabimento de medida de caráter excepcional e invasiva a direito fundamental garantido pela Constituição Federal”, afirmou.

A ministra ponderou que o alargamento das hipóteses de prisão civil, para alcançar também a prestação de alimentos de caráter indenizatório – segundo alguns doutrinadores, deveria valer para todos os credores de salários e honorários profissionais –, “acaba por enfraquecer a dignidade excepcional, a força coercitiva extrema, que o ordenamento jurídico, ao vedar como regra geral a prisão por dívida, concedeu à obrigação alimentar típica, decorrente de direito de família – a qual, em sua essência, é sempre variável de acordo com as necessidades e possibilidades dos envolvidos”.

Fonte: STJ

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Direito de Família Processo Civil STJ

STJ admite exclusão de nome escolhido por pai que abandonou a família

As exceções ao princípio da imutabilidade do nome expressamente previstas na Lei de Registros Públicos são meramente exemplificativas, sendo possível que o magistrado fundamente e determine a modificação se entender existente constrangimento.

Essa análise indubitavelmente subjetiva deve ser realizada sob a perspectiva do próprio titular do nome.

Com esse entendimento e por maioria, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso especial interposto por Ana Luiza, que ajuizou ação para excluir o prenome Ana porque a constrange e a faz lembrar do pai, que a abandonou ainda criança.

O pai saiu de casa para registrar a filha como Luiza mas voltou, segundo os autos, “ébrio de loucura e quando bem quis”, trazendo o registro com o prenome Ana incluído. Desde então, ela afirmou que se constrange toda vez que o nome Ana é suscitado, especialmente em situações formais.

Em primeiro grau, o pedido foi deferido. Mas o Tribunal de Justiça do Distrito Federal reformou a decisão porque, ao analisar as provas, entendeu que a autora não comprovou a notoriedade do nome social, sobretudo por testemunhas, e o constrangimento real quanto ao seu uso no cotidiano. O nome Ana, por si só, não causa problemas.

Análise subjetiva
Prevaleceu o voto do relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, segundo o qual o constrangimento suportado por uma pessoa por conta de seu nome pode ter diversas causas diferentes da meramente estética. “Sua avaliação indubitavelmente subjetiva deve ser realizada sob perspectiva do próprio titular do nome”, apontou.

O voto preferiu privilegiar a análise do juízo de primeiro grau, mais próximo das provas e que concluiu pela existência desse constrangimento. Além disso, a autora já é conhecida nos meios social e profissional exclusivamente como Luiza. A exclusão do prenome Ana não causa prejuízo à identificação familiar, já que o sobrenome será mantido, e não há evidência de má-fé ou prejuízo de terceiros.

“O Tribunal de Justiça limitou-se a elogiar o nome. Eu acho um nome lindo. Não está em discussão o nome. O problema é o constrangimento que traz na questão da relação paterna”, explicou o relator. Ele foi acompanhado pelos ministros Luís Felipe Salomão e Isabel Gallotti.

Lei de Registros Públicos
Abriu divergência o ministro Marco Buzzi, para quem o acórdão recorrido deixou claro que não existem provas suficientes para configurar a excepcionalidade necessária para permitir a mudança no registro civil. Ela não comprovou, sequer, que o prenome Ana foi de fato escolhido pelo genitor. Alterar essas conclusões esbarraria na Súmula 7 do STJ, que impede reanálise de provas.

“A mera alegação de que é conhecida popularmente como Luiza desacompanhada de outros elementos, conforme demonstrou o acórdão do Tribunal, não é suficiente para afastar o princípio da imutabilidade, sob pena de se transformar a exceção em regra”, afirmou o ministro Marco Buzzi.

O ministro Raul Araújo também divergiu e concordou. Ele chamou a atenção para os critérios elencados na Lei 6.015/1973 — casos excepcionais e fundamentados ou situações como fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime.

“Ou temos um sistema de registros públicos de nomes minimamente comprometido com alguma higidez ou até poderemos dispensar esse registro, e cada pessoa vai se chamando como quiser à medida que os fatos forem transcorrendo na vida”, criticou.

Tempos são outros
Ao analisar a norma, o voto do relator destacou que o artigo 56 admite a modificação do prenome em circunstâncias muito menos rigorosas do que a do caso de Luiza. Ele afirma que é possível fazer a mudança em até um ano após completar 18 anos de idade, “desde que não prejudique os apelidos de família”. Não há quaisquer outros requisitos.

“A Lei de Registros é de 1973, época em que a imutabilidade dos nomes era necessária para conservar a segurança jurídica das relações. Com o avanço da tecnologia, o nome deixou de ser o único ou o principal recurso de identificação, cedendo espaço para formas mais modernas e eficiências, como registros numéricos, identificação digital, por imagem, redes sociais, etc”, elencou.

REsp 1.514.382

Fontes: STJ e CONJUR

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Direito Penal STJ

Invasão de domicílio sem mandado é válida se ninguém mora no local, diz STJ

A proteção constitucional à inviolabilidade de domicílio pressupõe que o indivíduo o utilize para fins de habitação e moradia, ainda que de forma transitória, pois refere-se ao bem jurídico da intimidade da vida privada. Assim, não é nula a invasão feita sem mandado judicial se há suspeitas de que o local é utilizado única e exclusivamente para armazenar drogas e armas.

Com esse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça denegou Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública de Santa Catarina que defendia a nulidade das provas obtidas por meio de invasão de um apartamento sem mandado judicial.

Relator do caso, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca fez diferenciação entre os casos em que incide a proteção constitucional e o caso concreto julgado. Citou que o conceito de casa para fim de proteção jurídico-institucional tem caráter amplo e vale para qualquer compartimento habitado ou privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. Também citou doutrina no mesmo sentido.

“A proteção constitucional, no tocante à casa, independentemente de seu formato e localização, de se tratar de bem móvel ou imóvel, pressupõe que o indivíduo a utilize para fins de habitação, moradia, ainda que de forma transitória, pois tutela-se o bem jurídico da intimidade da vida privada”, afirmou.

Não é o que ocorreu no caso julgado. Os policiais receberam notícia anônima de que uma quitinete era usada para armazenar drogas e armas. Foram informados pelos vizinhos que ninguém residia no endereço. Aguardaram a movimentação de moradores, em vão. E conseguiram enxergar, por uma das janelas, os objetos do crime.

“Com tudo isso em mente e sem desconsiderar a proteção constitucional de que goza a propriedade privada, ainda que desabitada, a busca e apreensão sem mandado judicial em exame não teria o condão de manchar de nulidade a atuação dos policiais ou as provas colhidas na ocasião”, concluiu o ministro Reynaldo Soares da Fonseca.

E o portão do prédio?
O relator ainda destacou que o fato de o prédio de apartamentos ser cercado por muro com um portão pelo qual entraram os policiais antes de se dirigir à quitinete não induz, necessariamente, à conclusão de que a transposição do portão, por si só, já implicaria afronta à garantia de inviolabilidade do domicílio.

“Há depoimento de um dos policiais, afirmando que tal portão estaria aberto e também não há notícia de que tal portão estivesse trancado, ou que houvesse interfone ou qualquer outro tipo de aparelho/mecanismo de segurança destinado a limitar a entrada de indivíduos que quisessem ter acesso ao prédio já no muro externo”, explicou.

Diferenciação
O caso traz uma importante diferenciação em relação às possibilidades de invasão de domicílio sem mandado. O STJ tem ampla jurisprudência quanto à nulidade da prática.

Em casos recentes, decidiu que a invasão não se justifica, por exemplo, quando o suspeito tem fama de traficante, age em atitude suspeita e demonstra nervosismo, é motivada por cão farejador que sente o cheiro de drogas pelo lado de fora da casa ou quando ocorre perseguição a veículo que desobedece ordem de parada em bloqueio policial.

HC 588.445

Fonte: STJ

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Decisões importantes Processo Civil STJ

Multa de 10% no cumprimento de sentença exige intempestividade ou efetiva resistência do devedor

A multa de 10% prevista no parágrafo 1º do artigo 523 do Código de Processo Civil está condicionada à intempestividade do pagamento ou à resistência manifestada na fase de cumprimento de sentença. Assim, a simples afirmação do executado de que cogita se insurgir contra o cumprimento de sentença não justifica a penalidade.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de uma empresa e manteve decisão que, ante o pagamento integral e tempestivo do débito, afastou a aplicação da multa.

A controvérsia surgiu porque a parte executada, ao depositar o valor, informou explicitamente que o depósito não constituía pagamento, mas sim garantia do juízo, e que teria o poder de assegurar efeito suspensivo à impugnação que seria apresentada posteriormente. Essa impugnação, porém, acabou não ocorrendo.

O juízo declarou a execução extinta e rejeitou o pedido da empresa para aplicar a multa de 10% prevista no parágrafo 1º do artigo 523 do CPC. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão.

No recurso especial, a empresa sustentou que a multa seria devida, pois – segundo seu entendimento – o executado não depositou o valor para liquidar efetivamente a dívida, mas apenas com o propósito de obter efeito suspensivo para a impugnação.

Precede​ntes

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, mencionou precedente da Quarta Turma (REsp 1.175.763) segundo o qual não caracteriza pagamento voluntário o depósito judicial feito pelo devedor apenas para permitir a oposição de impugnação – situação em que é aplicável a multa de 10%, pois o dinheiro não ficou disponível para o credor.

A relatora assinalou que, naquele caso, a parte executada – depois de anunciar que o depósito se prestava à garantia do juízo – efetivamente ofereceu a impugnação.

Em outro precedente citado pela ministra (REsp 1.803.985), a Terceira Turma estabeleceu que a multa só será excluída se o executado depositar a quantia devida “sem condicionar seu levantamento a qualquer discussão”.

Caráter c​​oercitivo

“Considerando o caráter coercitivo da multa, a desestimular comportamentos exclusivamente baseados na protelação da satisfação do débito perseguido, não há de se admitir sua aplicação para o devedor que efetivamente faz o depósito integral da quantia dentro do prazo legal e não apresenta impugnação”, comentou Nancy Andrighi.

“Não basta a mera alegação de que o executado pondera se insurgir contra o cumprimento de sentença para automaticamente incidir a multa. É preciso haver efetiva resistência do devedor por meio do protocolo da peça de impugnação para, então, estar autorizada a incidência da multa do parágrafo 1º do artigo 523”, afirmou.

A relatora apontou que, no caso analisado, embora a parte executada tenha classificado o depósito como garantia do juízo e alertado sobre a impugnação e o pretendido efeito suspensivo, é incontroverso que ela quitou o débito no prazo legal.

“A recorrida não ofereceu resistência, realizando o pagamento voluntário e integral da quantia perseguida pela recorrente em cumprimento de sentença (R$ 1.113.893,97)”, declarou a ministra, observando que, inclusive, o valor depositado foi levantado pela exequente – o que, para ela, é “razão suficiente para afastar a incidência da multa”.

Leia o acórdão.

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Decisões importantes Direito de Família Notícias de última hora Novidades Processo Civil STJ

Sentença que desconstitui filiação gera efeitos mesmo sem averbação no registro civil

A sentença que desconstitui o vínculo de filiação produz efeitos mesmo sem a sua averbação no registro civil, impedindo, assim, que aquele que foi excluído da condição de filho possa entrar no inventário como se fosse herdeiro do falecido.

O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão de segunda instância que reconheceu que a decisão que autoriza a expedição de mandado de averbação de sentença de procedência, exarada em ação negatória de maternidade e transitada em julgado em 1992, a fim de instruir pedido de habilitação nos autos de inventário, não ofende direito líquido e certo do impetrante.

Para o colegiado, a averbação de sentença transitada em julgado, a qual declara ou reconhece determinado estado de filiação, constitui consequência legal obrigatória, destinada a conferir publicidade e segurança jurídica ao desfecho declarado e reconhecido judicialmente – o que se dá, ordinariamente, de ofício.

Por esse motivo, o procedimento de averbação não é atingido por prazo prescricional ou decadencial. Além disso, caso não seja realizado dentro dos trâmites normais da ação, pode ser posteriormente determinado de ofício ou mediante requerimento – a qualquer tempo – das partes interessadas, como os herdeiros.

Certidão vel​ha

No caso analisado pela Terceira Turma, a ação negatória de maternidade foi promovida pela suposta mãe. Após sua morte, o interessado requereu a habilitação no processo de inventário – iniciado em 2011 –, utilizando certidão de nascimento sem a alteração da filiação materna.

O juiz responsável pelo inventário determinou que a inventariante juntasse aos autos a certidão de nascimento atualizada do interessado, com a averbação da exclusão da maternidade decidida judicialmente. Após confirmar a falta de encaminhamento do mandado de averbação original, a inventariante requereu ao juízo onde tramitou a ação negatória de maternidade a expedição de novo documento para a averbação – pedido atendido pelo magistrado.

Em mandado de segurança – que foi negado pelo tribunal estadual –, o interessado alegou que a sentença que desconstituiu a maternidade transitou em julgado em 1992, motivo pelo qual deveria ser reconhecido o transcurso do prazo prescricional de quatro anos para a mudança do registro de nascimento, nos termos do inciso VI do parágrafo 9º do artigo 178 do Código Civil de 1916.

Ainda segundo ele, como o processo tramitou em segredo de Justiça, não poderia ter sido dada vista dos autos à inventariante; além disso, tratando-se de direito personalíssimo, apenas ele ou a falecida poderiam ter dado cumprimento à sentença.

Publicidade e segura​​​nça

O relator do caso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que a averbação de sentença transitada em julgado que declara estado de filiação constitui consequência legal obrigatória, destinada a conferir publicidade e segurança jurídica à decisão judicial.

“Não existe, assim, nenhuma faculdade conferida às partes envolvidas a respeito de proceder ou não à referida averbação, como se tal providência constituísse, em si, um direito personalíssimo destas”, afirmou o ministro.

De acordo com o relator, não é possível confundir o exercício do direito subjetivo de uma ação de caráter personalíssimo – como o processo de desconstituição de filiação, cuja prerrogativa é exclusiva das pessoas inseridas nesse vínculo jurídico – com o ato acessório de averbação da sentença de procedência transitada em julgado.

Interesse do es​​pólio

Para o ministro Bellizze, o fato de a falecida não ter promovido a averbação no cartório – providência que, na verdade, nem sequer lhe incumbia – não significa que não houvesse a intenção de desconstituir o vínculo de filiação; ao contrário, segundo o ministro, a circunstância de ter sido ela quem propôs a ação basta para demonstrar essa intenção.

Em seu voto, Marco Aurélio Bellizze rejeitou a alegação de falta de legitimidade dos herdeiros para promover a averbação da sentença, pois, além de esse ato não se confundir com o direito personalíssimo discutido na ação negatória de filiação, é inquestionável o interesse jurídico do espólio, representado pela inventariante, sobretudo em razão do pedido de habilitação feito pelo interessado – cujo registro civil deve, necessariamente, corresponder à realidade atual dos fatos.

Em relação ao segredo judicial, Bellizze ressaltou que o Código de Processo Civil, em seu artigo 189, autoriza expressamente que terceiros com comprovado interesse jurídico possam ter acesso ao dispositivo da sentença, podendo extrair a correspondente certidão.

“Saliente-se, a esse propósito, que o fato de o processo tramitar em segredo de Justiça é circunstância absolutamente indiferente à natural repercussão dos efeitos da coisa julgada”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso em mandado de segurança.

Fonte: STJ

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

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STJ: Separação de fato cessa impedimento para fluência do prazo da usucapião entre cônjuges

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a separação de fato de um casal é suficiente para fazer cessar a causa impeditiva da fluência do prazo necessário ao reconhecimento da usucapião entre cônjuges.

Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso de uma mulher que ajuizou, em 2014, ação de usucapião do imóvel no qual residia com o marido até a separação de fato, em 2009, quando ele deixou o lar. Segundo o processo, os dois se casaram em 1986 e passaram a morar na propriedade adquirida por ele em 1985.

A autora da ação pediu o reconhecimento da usucapião familiar (artigo 1.240-A do Código Civil) ou, subsidiariamente, da usucapião especial urbana (artigo 1.240 do CC).

Para o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), a usucapião familiar não seria possível, já que não havia copropriedade do casal sobre o imóvel; e a usucapião especial urbana também não, pois o prazo de cinco anos exigido pelo CC não poderia ser contado a partir da separação de fato, mas apenas da separação judicial ou do divórcio, como previsto expressamente na lei.

No recurso especial, a autora questionou exclusivamente a decisão do TJMG em relação à usucapião especial urbana.

Fluência da pres​crição

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, explicou que o Código Civil prevê duas espécies distintas de prescrição: a extintiva, relacionada ao escoamento do prazo para pedir em juízo a reparação de um direito violado (artigos 189 a 206), e a aquisitiva, relacionada à forma de aquisição da propriedade pela usucapião.

Com base em ensinamentos doutrinários, a ministra ressaltou que o impedimento ao cômputo da prescrição entre cônjuges – previsto no artigo 197, inciso I, do CC –, embora situado no capítulo das prescrições extintivas, também se aplica à prescrição aquisitiva, ou seja, à usucapião.

Segundo ela, esse impedimento – “constância da sociedade conjugal” – cessa pela separação judicial ou pelo divórcio, como estabelecido nos incisos III e IV do artigo 1.571 do CC. No entanto, a relatora ressaltou que, recentemente, a Terceira Turma reconheceu a possibilidade de se admitir a fluência da prescrição entre cônjuges a partir da separação de fato.

Situações vinc​​uladas

“A regra do artigo 197, I, do CC/2002 está assentada em razões de ordem moral, buscando-se com ela a preservação da confiança, do afeto, da harmonia e da estabilidade do vínculo conjugal, que seriam irremediavelmente abalados na hipótese de ajuizamento de ações judiciais de um cônjuge em face do outro ainda na constância da sociedade conjugal”, afirmou a ministra.

Para ela, a separação de fato por longo período, como observado no precedente, produz exatamente o mesmo efeito das formas previstas no CC para o término da sociedade conjugal, “não se podendo impor, pois, tratamento diferenciado para situações que se encontram umbilicalmente vinculadas”.

Nancy Andrighi destacou que, na hipótese em análise, a separação de fato do casal ocorreu em 3 de julho de 2009, e a ação de usucapião foi ajuizada pela mulher em 31 de julho de 2014, razão pela qual foi cumprido o requisito do prazo (cinco anos) para a usucapião especial urbana.

A ministra verificou que o TJMG se limitou a afastar a configuração dessa espécie de usucapião ao fundamento de que não teria decorrido o prazo mínimo necessário, deixando de examinar a presença dos demais pressupostos legais previstos no artigo 1.240 do CC.

Dessa forma, o colegiado deu provimento ao recurso para que a corte de segunda instância reexamine o caso em seus outros aspectos, superada a questão relativa ao prazo.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

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STJ: Terceira Turma considera melhor interesse da criança e mantém decisão que deu guarda unilateral ao pai

A partir do início da vigência daLei 13.058/2014, a guarda compartilhada foi adotada pelo sistema jurídico brasileiro como o modelo prioritário. Entretanto, no momento de decidir sobre o tipo de guarda, o juiz deve analisar as especificidades que envolvem a relação entre pais e filhos e, sobretudo, considerar o princípio constitucional do melhor interesse da criança – que pode levar, inclusive, ao estabelecimento da guarda unilateral.

O entendimento foi reafirmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que fixou a guarda unilateral de uma criança para o pai. Entre outros elementos, a corte local levou em conta a recusa da mãe em se submeter a tratamento psicoterápico; os registros de intensa disputa entre os pais em relação aos interesses da filha e, ainda, as declarações de profissionais no sentido de que a criança preferia ficar com o pai, pois sofria com o isolamento e o tratamento inadequado na companhia da mãe. 

A despeito de a jurisprudência do STJ entender que a guarda compartilhada deve ser instituída independentemente da vontade dos genitores ou de acordo entre as partes, o relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que “o instituto não deve prevalecer quando sua adoção for negativa aos interesses da criança ou lhe seja, inclusive, penoso ou arriscado“.

No caso, o pai ajuizou ação com o objetivo de obter a guarda da filha sob a alegação da prática de atos de alienação parental por parte da genitora.

Guarda e vi​sitas

Em primeiro grau, embora tenha fixado a guarda compartilhada, o juiz determinou que a criança ficasse morando com o pai e estabeleceu regime de visitas maternas, condicionando a ampliação das visitas à submissão da mãe a tratamento psicoterápico.

Ambos apelaram da sentença, mas o TJSP acolheu apenas o recurso do pai, estabelecendo a guarda unilateral da criança a seu favor.

Por meio de recurso especial, a mãe alegou que, nos termos dos artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil, a guarda compartilhada não está condicionada à possibilidade de convívio amistoso entre os pais. Segundo ela, as duas únicas exceções à guarda compartilhada seriam quando um dos pais não a deseja e quando um deles não é capaz de exercer o poder familiar.

Novo parad​igma

O ministro Villas Bôas Cueva afirmou que a Lei 13.058/2014 rompeu paradigmas seculares, propiciando novos parâmetros para a aplicação dos modelos de guarda. No caso do formato compartilhado, explicou, há a possibilidade de que a família, mesmo não tendo vínculo conjugal, exista na modalidade parental.

Entretanto, o ministro lembrou que a aplicação da lei se submete à interpretação dos princípios constitucionais, sobretudo da cláusula de supremacia do melhor interesse do menor.

Em relação aos artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil, o relator apontou que a guarda unilateral será mantida quando houver a inaptidão de um dos pais – situação que poderá ocorrer de inúmeras formas, que não passam, necessariamente, pela perda do poder familiar.

O magistrado, ao analisar hipóteses como a ora em apreço, de aplicação da guarda compartilhada, não pode se furtar a observar o princípio do melhor interesse do menor, que permeia toda e qualquer relação envolvendo conflitos dessa natureza“, declarou.

Villas Bôas Cueva considerou que esse princípio foi elevado à condição de metaprincípio por possuir função preponderante na interpretação das leis, em decorrência da natureza específica e vulnerável do menor.

Fonte: STJ