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STJ: Implantação de embriões congelados em viúva exige autorização expressa do falecido, decide Quarta Turma

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, restabeleceu sentença que proibiu a implantação de embriões criopreservados em uma viúva, por entender que tal procedimento, para ser realizado após a morte do cônjuge, depende de consentimento expresso e inequívoco.

Na origem do caso, os filhos do primeiro casamento pediram judicialmente que fosse impedida a utilização do material genético do pai – morto em 2017 – pela madrasta viúva, sustentando não existir documento que comprovasse autorização dada em vida.

O falecido e a viúva eram casados desde 2013 sob o regime legal de separação absoluta de bens, já que ele tinha 72 anos na época da celebração do matrimônio. Em testamento particular, o falecido teria deixado a parte disponível da herança para os filhos do primeiro casamento e, para a esposa, o valor de R$ 10 milhões, além do dinheiro necessário para a compra de um apartamento.

Acordo sobre cust​​ódia dos embriões

A viúva alegou que haveria autorização do marido para a criopreservação e posterior implantação dos embriões, e que não existiria exigência legal quanto à forma de manifestação desse consentimento.

O juízo de primeiro grau julgou o pedido dos filhos procedente, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a sentença tendo em vista o contrato com o hospital encarregado de conservar o material genético, no qual o casal acordava que, em caso de morte de um deles, os embriões congelados ficariam sob a custódia do outro.

Para a corte paulista, os embriões criopreservados são “inservíveis a outra finalidade que não a implantação em útero materno”, e confiar sua guarda à parceira viúva representaria “autorização para a continuidade do procedimento“.

Reprodução assis​tida carece de regras

O ministro Luis Felipe Salomão – cujo voto prevaleceu na Quarta Turma – destacou que o ordenamento jurídico brasileiro possui regulamentação insuficiente para a resolução de conflitos sobre reprodução assistida. O Código Civil de 2002, por exemplo, é omisso quanto à possibilidade de utilização do material genético de pessoa falecida.

De acordo com o magistrado, a Resolução 2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina (CFM) preceitua ser possível a reprodução assistida póstuma, desde que haja autorização prévia específica do falecido para o uso do material biológico criopreservado.

Ele também mencionou o Provimento 63/2017 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), segundo o qual, na reprodução assistida após a morte, deverá ser apresentado termo de autorização prévia específica da pessoa falecida para o uso de seu material genético, lavrado por instrumento público ou particular com firma reconhecida – mesma linha adotada pelo Enunciado 633 do Conselho da Justiça Federal (CJF).

Efeitos para al​ém da vida

No caso em julgamento, o ministro observou que, como a decisão de autorizar a utilização dos embriões projetaria efeitos para além da vida do indivíduo – com implicações não só patrimoniais, mas também relacionadas à personalidade do genitor e dos que seriam concebidos –, a sua manifestação de vontade deveria se dar de maneira incontestável, por meio de testamento ou outro instrumento equivalente em termos de formalidade e garantia.

Para o magistrado, considerar o contrato de prestação de serviços com o hospital uma declaração inequívoca de vontade do falecido significaria admitir o rompimento do testamento que ele deixou, com alteração do planejamento sucessório original por pessoa diferente do próprio testador. O ministro apontou que o hospital também entendeu não haver autorização do marido para a implantação dos embriões após a sua morte.

A autorização dada no contrato – concluiu Salomão – serve apenas para que a viúva possa ceder o material genético para pesquisa, descartá-lo ou deixá-lo intocado, “mas nunca implantá-lo em si, porque aí necessitaria de autorização prévia e expressa”.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

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Advocacia Novidades Processo Civil

STJ afasta penhora de aplicação financeira de até 40 salários-mínimos

A 1ª turma do STJ afastou a penhora de até 40 salários-mínimos em qualquer tipo de conta bancária.

São impenhoráveis os saldos inferiores a 40 salários-mínimos depositados em caderneta de poupança, em outras aplicações financeiras e em contas-correntes. Essa foi a decisão da 1ª turma do STJ ao ressaltar precedentes do Tribunal.

A decisão da 1ª turma se deu no âmbito de ação na qual a parte defendia a natureza alimentar dos honorários advocatícios. Para o agravante, não poderia se falar de impenhorabilidade de valores inferiores a 40 salários-mínimos em aplicação financeira, mas, apenas, em conta poupança.

Ao apreciar o caso, o ministro Benedito Gonçalves observou que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, até o limite de 40 salários-mínimos depositados em qualquer tipo de conta bancária, a impenhorabilidade há de ser respeitada.

Para embasar seu voto, o relator citou julgado no REsp 1.795.956, ocasião na qual a 3ª turma decidiu que são impenhoráveis os valores poupados pelo devedor, seja em caderneta de poupança, conta-corrente, fundo de investimentos ou em papel-moeda, até o limite de 40 salários-mínimos.

Ao seguir o entendimento do relator, por unanimidade, a 1ª turma negou provimento ao recurso.

Leia a íntegra do acórdão.

Por: Redação do Migalhas

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Consumidor Direito Civil Direito Médico STJ

O direito de permanência em plano de saúde para aposentados e demitidos sem justa causa

A Constituição Federal de 1988 estabelece que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Para cumprir o mandamento constitucional, o poder público pode prestar os serviços diretamente ou por meio de terceiros, inclusive de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. Nesse contexto, os planos e seguros de saúde proporcionam aos seus beneficiários a possibilidade de ter um atendimento, em geral, mais rápido e com mais qualidade do que o oferecido em instituições públicas, normalmente sobrecarregadas.

Com a finalidade de proporcionar saúde a seus empregados e atrair novos colaboradores, órgãos públicos e empresas privadas incluem em seu plano de benefícios a oportunidade de contratação de plano ou seguro de saúde subsidiado. Muitas controvérsias jurídicas advêm dessa relação operadora-empregador-empregado – entre elas, as discussões sobre o direito de trabalhadores demitidos ou aposentados permanecerem no plano de assistência à saúde.

Não raras vezes, o tema do direito de permanência ​é enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que interpreta a lei buscando conciliar os direitos das três partes e promover, tanto quanto possível, o bem-estar do trabalhador, fragilizado pela possibilidade de ficar sem a cobertura.

A Lei 9.656/1998, em seus artigos 30 e 31, e os normativos editados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) regulamentaram o direito de permanência no plano, mas, quando surgem dúvidas na aplicação de tais instrumentos, o Judiciário é provocado a saná-las.

Cancelamen​to pelo empregador

No julgamento do REsp 1.736.898, a Terceira Turma do STJ, sob a relatoria da ministra Nancy Andrighi, decidiu que não subsiste o direito do ex-empregado a permanecer no plano de saúde na hipótese em que a pessoa jurídica estipulante rescinde o contrato com a operadora, afetando não apenas um beneficiário, mas toda a população do plano coletivo.

O caso analisado teve origem em ação ajuizada por um aposentado que requereu sua manutenção no plano por prazo indeterminado, alegando que contribuiu por mais de dez anos, razão pela qual teria o direito de permanecer, nos moldes do artigo 31 da Lei 9.656/1998. Afirmou ainda que a circunstância de ter pagado as contribuições diretamente à ex-empregadora não prejudicou em nada a operadora, pois os valores eram quitados integralmente.

Em seu voto, a relatora apontou que, conforme o artigo 26, inciso III, da Resolução Normativa 279/2011da ANS, uma das formas de extinção do direito de permanência do inativo no plano de saúde é o seu cancelamento pelo empregador que concede esse benefício aos empregados ativos e ex-empregados.

“Independentemente de o pagamento da contribuição do beneficiário ter sido realizado diretamente em favor da pessoa jurídica estipulante, por mais de dez anos, a rescisão do plano de saúde coletivo ocorreu em prejuízo de toda a população anteriormente vinculada”, esclareceu a ministra.

A magistrada destacou que, em tais circunstâncias, as operadoras que mantenham também plano de saúde na modalidade individual ou familiar deverão disponibilizar esse regime ao universo dos beneficiários, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência, nos termos da Resolução 19/1999 do Conselho de Saúde Suplementar (Consu).

Aposentado c​​​ontratado

Outro importante julgamento da Terceira Turma, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, foi o do REsp 1.371.271, no qual se entendeu pela possibilidade de aplicação do artigo 31 da Lei 9.656/1998 ao aposentado – e ao grupo familiar inscrito, na hipótese de seu falecimento – que é contratado por empresa e, posteriormente, demitido sem justa causa.

No caso analisado pela turma, a viúva de um aposentado que trabalhava em uma empresa de engenharia requereu sua permanência por período indeterminado no plano de saúde do falecido, que havia sido demitido sem justa causa meses antes de sua morte.

Segundo ela, o marido contribuiu por nove anos e oito meses com o plano e, após sua morte, a operadora permitiu que ela continuasse contribuindo como titular, o que totalizou um período de mais de dez anos de pagamento, como exigido pelo artigo 31 da Lei 9.656/1998.

A operadora do plano defendeu a aplicação do artigo 30, alegando que o falecido teria sido demitido sem justa causa, fazendo jus à manutenção do plano de saúde, desde que assumido o seu pagamento integral, pelo período mínimo de seis e máximo de 24 meses.

A ministra Nancy Andrighi destacou que “o texto legal não evidencia, de forma explícita, que a aposentadoria deve dar-se posteriormente à vigência do contrato de trabalho, limitando-se a indicar a figura do aposentado – sem fazer quaisquer ressalvas – que tenha contribuído para o plano de saúde, em decorrência do vínculo empregatício”.

Entretanto, a relatora não acolheu as alegações da viúva, por entender que a lei expressamente exige que o aposentado tenha contribuído por prazo mínimo de dez anos, não podendo esse papel ser exercido por seus dependentes.

Supressi​​o

Ao julgar o REsp 1.879.503, também de relatoria da ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma confirmou decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) e determinou que uma empresa mantivesse, com base na proteção da confiança (supressio), o plano de saúde oferecido a um ex-funcionário, mesmo passados mais de dez anos do fim do vínculo empregatício.

Segundo os autos, o funcionário foi demitido em 2001, e em 2003 se esgotou o prazo legal previsto no artigo 30, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 para a manutenção do plano de saúde após o rompimento do vínculo. Contudo, o contrato foi prorrogado por liberalidade da empresa e com assunção do custo total até 2013, quando então o ex-empregado, com 72 anos de idade, foi notificado pela ex-empregadora de sua exclusão do plano de saúde.

Em seu voto, a relatora do caso destacou que a Lei 9.656/1998 prevê que o empregado demitido se mantenha no plano coletivo empresarial, após o rompimento do vínculo, pelo período máximo 24 meses.

Entretanto, na hipótese analisada, Nancy Andrighi destacou que o fato de a empresa ter mantido o segurado e sua esposa no plano, ao longo de dez anos, superou em muito o prazo legal que autorizava a exclusão, o que despertou nos consumidores a confiança na manutenção vitalícia do benefício.

Boa-fé o​​​bjetiva

A magistrada comentou que a responsabilidade pela confiança constitui “uma das vertentes da boa-fé objetiva, enquanto princípio limitador do exercício dos direitos subjetivos, e coíbe o exercício abusivo do direito, o qual, no particular, se revela como uma espécie de não exercício abusivo do direito, de que é exemplo a supressio“.

Ela explicou que a supressio indica a possibilidade de se considerar extinta determinada obrigação contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente pelo credor gere no devedor a legítima expectativa de que esse não exercício se prorrogará no tempo.

“O abuso do direito – aqui caracterizado pela supressio – é qualificado pelo legislador como espécie de ato ilícito (artigo 187 do Código Civil de 2002), no qual, em verdade, não há desrespeito à regra de comportamento extraída da lei, mas à sua valoração; o agente atua conforme a legalidade estrita, mas ofende o elemento teleológico que a sustenta, descurando do dever ético que confere a adequação de sua conduta ao ordenamento jurídico”, afirmou.

Custeio ex​​​​clusivo

Sob o rito dos recursos repetitivos, ao analisar os Recursos Especiais 1.680.318 e 1.708.104, a Segunda Seção definiu que, nos planos coletivos custeados exclusivamente pelo empregador, não há direito de permanência do ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa, salvo disposição contrária expressa em contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho, não caracterizando contribuição o pagamento apenas de coparticipação, tampouco se enquadrando o plano como salário indireto.

A tese foi cadastrada como Tema 989 na base de dados do STJ. A relatoria foi do ministro Villas Bôas Cueva, que destacou que uma das condições exigidas pela Lei 9.656/1998, artigos 30 e 31, para a aquisição do direito de permanência do inativo no plano é justamente ter contribuído na ativa para o seu custeio, o que significa pagar uma mensalidade, independentemente de usar a assistência médica.

O magistrado lembrou que a coparticipação do consumidor exclusivamente em procedimentos não é considerada contribuição, pois é tão somente um fator de moderação, cuja função é evitar o uso desenfreado dos serviços da saúde suplementar.

Já no caso de inclusão do empregado em plano privado superior de assistência à saúde (upgrade), com pagamento de valor periódico fixo, oferecido pelo empregador em substituição ao originalmente disponibilizado sem a sua participação, incidirão os mesmos direitos do inativo contribuinte – informou o relator.

Villas Bôas Cueva salientou ainda que o plano de assistência médica, hospitalar e odontológica concedido pelo empregador não tem índole salarial, independentemente de serem os serviços prestados de forma direta pela empresa ou por determinada operadora.

“O plano de saúde fornecido pela empresa empregadora, mesmo a título gratuito, não possui natureza retributiva, não constituindo salário-utilidade (salário in natura), sobretudo por não ser contraprestação ao trabalho. Ao contrário, referida vantagem apenas possui natureza preventiva e assistencial, sendo uma alternativa às graves deficiências do Sistema Único de Saúde (SUS), obrigação do Estado”, declarou.

Assistência e c​usteio

Também no rito dos repetitivos, sob relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira, a Segunda Seção firmou três teses sobre quais condições assistenciais e de custeio do plano deveriam ser mantidas para beneficiários inativos, nos termos do artigo 31 da Lei 9.656/1998 (Tema 1.034).

A primeira tese fixou que “eventuais mudanças de operadora, de modelo de prestação de serviço, de forma de custeio e de valores de contribuição não implicam interrupção da contagem do prazo de dez anos previsto no artigo 31 da Lei 9.656/1998, devendo haver a soma dos períodos contributivos para fins de cálculo da manutenção proporcional ou indeterminada do trabalhador aposentado no plano coletivo empresarial”.

Na segunda, ficou definido que “o artigo 31 da Lei  9.656/1998 impõe que ativos e inativos sejam inseridos em plano de saúde coletivo único, contendo as mesmas condições de cobertura assistencial e de prestação de serviço, o que inclui, para todo o universo de beneficiários, a igualdade de modelo de pagamento e de valor de contribuição, admitindo-se a diferenciação por faixa etária se for contratada para todos, cabendo ao inativo o custeio integral, cujo valor pode ser obtido com a soma de sua cota-parte com a parcela que, quanto aos ativos, é proporcionalmente suportada pelo empregador”.

A última estabeleceu que “o ex-empregado aposentado, preenchidos os requisitos do artigo 31 da Lei 9.656/1998, não tem direito adquirido de se manter no mesmo plano privado de assistência à saúde vigente na época da aposentadoria, podendo haver a substituição da operadora e a alteração do modelo de prestação de serviços, da forma de custeio e dos respectivos valores, desde que mantida paridade com o modelo dos trabalhadores ativos e facultada a portabilidade de carências”.

Ao propor a afetação dos Recursos Especiais 1.818.4871.816.482 e 1.829.862 para julgamento da questão repetitiva, o ministro Antonio Carlos Ferreira alertou para a relevância da controvérsia e destacou a multiplicação dos planos coletivos de saúde e dos processos envolvendo esse tipo de contratação.

Compe​​​tência

No REsp 1.695.986, a Terceira Turma, desta vez sob a relatoria do ministro Villas Bôas Cueva, entendeu que compete à Justiça estadual o processamento e o julgamento de feitos relacionados ao direito de ex-empregados aposentados ou demitidos sem justa causa permanecerem em plano de saúde coletivo oferecido pela própria empresa empregadora aos trabalhadores ativos, na modalidade de autogestão.

Discutiu-se, na ocasião, se a questão corresponderia à relação de trabalho, com a consequente remessa à Justiça trabalhista, ou se seria matéria civil, de competência da Justiça comum. Em seu voto, o relator destacou que a competência é fixada em razão da natureza da causa, definida pelo pedido e pela causa de pedir constantes da petição inicial.

Ele afirmou que, segundo a jurisprudência do STJ anterior às Leis 9.659/1998, 9.961/2000 (criadora da ANS) e 10.243/2001 (que alterou o parágrafo 2º do artigo 458 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT), competia à Justiça estadual julgar as ações relativas aos contratos de cobertura médico-hospitalar em geral.

Nos casos em que a ex-empregadora mantinha o próprio plano de saúde em favor de seus empregados, na modalidade de autogestão, a competência era da Justiça do Trabalho, visto que a discussão acerca do direito de manutenção no plano tinha relação direta com o contrato de trabalho extinto.

“De fato, antes da vigência desses diplomas legais, a relação jurídica mantida entre o usuário do plano de saúde e a entidade de autogestão empresarial era apenas uma derivação da relação de emprego, pois a regulação era feita pelo contrato de trabalho, por normas internas da empresa e, às vezes, por acordo coletivo de trabalho”, ressaltou o ministro.

A​​utonomia

Entretanto, com a edição das citadas leis, Villas Bôas Cueva apontou que a saúde suplementar – incluída a autogestão – adquiriu autonomia em relação ao direito do trabalho, por possuir campo temático, teorias, princípios e metodologias específicos. Dessa forma, as entidades de autogestão passaram a ser enquadradas como operadoras de planos de saúde, submetendo-se à regulação e à fiscalização da ANS. 

“Em virtude da autonomia jurídica, as ações originadas de controvérsias entre usuário de plano de saúde coletivo e entidade de autogestão (empresarial, instituída ou associativa) não se adequam ao ramo do direito do trabalho”, concluiu o relator.

Ele recordou ainda que o plano fornecido pela empregadora, mesmo a título gratuito, não possui natureza retributiva, não constituindo salário-utilidade (salário in natura), sobretudo por não ser contraprestação ao trabalho.

“Com maior razão, por já ter sido encerrado o seu contrato de trabalho, a pretensão do ex-empregado de manutenção no plano de assistência à saúde fornecido pela ex-empregadora não pode ser vista como simples relação de trabalho. Ao contrário, trata-se da busca de direito próprio de usuário contra a entidade gestora do plano de saúde”, declarou.​

Fonte: STJ

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Consumidor Direito Civil Novidades Processo Civil Responsabilidade Civil

Descumprimento de ordem judicial: Operadora indenizará advogado após não cessar ligações de publicidade

Uma operadora de telefonia deverá indenizar por danos morais um cliente e advogado por excesso de ligações de publicidade. A empresa de telefonia deveria parar de ligar para o cliente, conforme decisão liminar, mas manteve os contatos. Decisão do juiz de Direito Hilmar Castelo Branco Raposo Filho, da 21ª vara Cível de Brasília, fixou a multa por descumprimento em R$ 10 mil e danos morais em R$ 6 mil.

O advogado alegou que é cliente de operadora de telefonia há mais de 10 anos na modalidade pré-pago e, desde 2007, passou a receber com muita frequência ligações com a finalidade de oferecimento de pacotes de serviços.

Apesar de responder não ter interesse nos serviços, solicitar que não fossem mais realizadas ligações, realizar reclamação no serviço de atendimento, solicitação de bloqueio no site “não me perturbe” e tentativas de resolver a lide amigavelmente extrajudicialmente, a comunicação indesejada para oferecimento de serviços persiste ao longo dos anos.

Em liminar, o magistrado considerou que apesar de a situação incômoda estar estabelecida há bastante tempo, o dano é permanente e continuado, o que recomendaria a adoção imediata de medidas moduladas.

Assim, concedeu a tutela para determinar que a operadora proceda a interrupção de comunicações, sob pena de multa no valor de R$ 500 por descumprimento. Em contestação, a empresa aduziu que há ligações de terceiros e que as provas apontam mais de um celular.

Após o deferimento da medida liminar os contatos se mantiveram. Em sua defesa, a empresa alegou que o próprio cliente poderia fazer uso de serviço da internet para fazer cessar a propaganda inoportuna.

O juiz manteve o entendimento de que as provas juntadas, em especial as gravações, as reclamações e os contatos mantidos com a operadora, revelaram que houve abuso do direito de ofertar produtos.

Segundo o magistrado, a liminar foi da “mais completa clareza” ao delimitar a proibição de enviar publicidade ao número e aos e-mails do cliente e, não se cuida apenas da alegada inércia do cliente em por seus próprios meios interromper os incômodos, mas do descumprimento de uma ordem judicial.

“Ninguém discute o direito de um fornecedor ofertar seus produtos, da mesma forma que ninguém discute o despropósito da oferta quando é excessiva, justamente o que ocorreu no caso. O autor se viu vítima do mau proceder da requerida por tempo considerável e, ao contrário do que afirmou a empresa, não se manteve passivo.”

Diante disso, majorou a pena para o valor de R$ 2 mil por descumprimento e condenou a operadora a pagar R$ 6 mil por danos morais e R$ 10 mil de multa por descumprimento da ordem liminar.

O advogado Geison Rios Nascimento atua no caso.

  • Processo: 0729624-83.2020.8.07.0001

Veja a sentença.

Por: Redação do Migalhas

Atualizado em: 29/5/2021 07:27

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Advocacia Decisões importantes Direito Médico STJ

STJ: Sem má-fé do segurado, omissão de doença preexistente não impede cobertura do seguro prestamista

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que considerou indevida a cobertura de seguro prestamista no caso de segurado que omitiu sofrer de cardiopatia – doença anterior à contratação do seguro e que teria contribuído para a sua morte.

Ao restabelecer a sentença favorável ao pagamento do seguro, o colegiado concluiu que não houve má-fé do segurado no preenchimento do questionário de saúde, além de considerar que a seguradora, ao não exigir exame de saúde prévio, assumiu o risco do sinistro por doença preexistente, nos termos da Súmula 609 do STJ.

De acordo com o processo, a doença foi identificada pela seguradora em sindicância. Entretanto, ao responder ao questionário de saúde no momento da contratação do seguro, em 2012, o contratante assinalou negativamente a pergunta sobre a ocorrência, nos três anos anteriores, de moléstia que tivesse levado a tratamento médico, hospitalização ou intervenção cirúrgica. Ele morreu três meses depois da assinatura do contrato.

Segundo o TJRS , embora a cardiopatia não tenha sido a causa determinante da morte, ela poderia ser considerada uma importante agravante do quadro clínico do segurado, a ponto de influenciar nos termos da cobertura e nos valores, caso fosse declarada no momento da contratação.

Vida normal

O relator do recurso da família do segurado, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, afirmou que, de fato, o homem tinha ciência da doença na data da contratação, pois, além de um exame realizado em 2010, a sindicância apurou que exames anteriores, desde 2003, já apontavam a existência da cardiopatia.

Apesar disso, o relator ponderou que o questionário não indagava acerca da preexistência de doença, mas sobre problema que tivesse levado o segurado a fazer tratamento médico nos três anos anteriores à contratação, o que não ocorreu – ele levaria uma vida saudável e ativa, apenas com acompanhamento médico.

Para o magistrado, não é possível afirmar que a resposta negativa do segurado tenha violado a boa-fé objetiva, pois o resultado de seus exames não especificou se a doença estava em evolução, exigindo tratamento ou estabilizada, indicando apenas a necessidade de acompanhamento profissional.

Recusa descabida

Para Sanseverino, além de não ter havido má-fé do segurado, o seguro contratado foi na modalidade prestamista, cuja finalidade é a garantia de contrato de mútuo (como empréstimo e financiamento), ao passo que a hipótese mais comum de má-fé ocorre na contratação de seguro de vida.

“Assim, não tendo a seguradora exigido a realização de exame de saúde prévio à contratação, e não tendo sido comprovada má-fé do segurado, torna-se descabida a recusa de cobertura, devendo-se reformar o acórdão recorrido, para restabelecer os comandos da sentença”, concluiu o ministro.

Leia o acórdão.

Fonte: STJ

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Processo Penal STF

LEI QUE IMPEDE NOMEAÇÃO DE CONDENADOS PELA LEI MARIA DA PENHA É CONSTITUCIONAL

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu provimento a um Recurso Extraordinário (RE 1308883) para reconhecer a constitucionalidade de lei do município de Valinhos (SP) que impede a administração pública de nomear pessoas condenadas pela Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) para cargos públicos.

O recurso, de autoria da Câmara Municipal de Valinhos e do Ministério Público paulista, questionava decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que considerou a norma inconstitucional. Segundo o TJ-SP, a Lei municipal 5.849/2019 teria violado o princípio da separação de Poderes, pois a competência para a iniciativa de lei sobre regime jurídico dos servidores é reservada ao chefe do Poder Executivo.

Regra de moralidade

Para Fachin, no entanto, não é disso que trata a lei municipal questionada, que impôs regra geral de moralidade administrativa, com o objetivo de atender os princípios previstos na Constituição Federal (caput do artigo 37).

O ministro citou, ainda, jurisprudência do STF (RE 570392) segundo a qual não é privativa do chefe do Poder Executivo a competência para a iniciativa legislativa de lei sobre nepotismo na administração pública. Nesse ponto, lembrou posicionamento anterior da ministra Cármen Lúcia no sentido de que leis com esse conteúdo dão concretude aos princípios da moralidade e da impessoalidade.

Leia a íntegra da decisão.

Fonte: STF

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Advocacia Processo Penal STJ

Falta de acesso da defesa a dados da investigação leva Sexta Turma a anular ação contra ex-prefeito

Por entender que a falta de acesso à íntegra das informações colhidas na investigação configura cerceamento de defesa, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso em habeas corpus para anular, desde o recebimento da denúncia, o processo criminal que envolve o ex-prefeito de São Gonçalo (RJ) Neilton Mulim da Costa, resultado da Operação Apagão.

Com a decisão, tomada por unanimidade, o colegiado determinou a abertura de novo prazo para apresentação de resposta à acusação e permitiu à defesa do ex-prefeito consultar previamente todos os documentos e objetos apreendidos no cumprimento dos mandados de busca e apreensão expedidos na ação penal.

A Operação Apagão investigou crimes de responsabilidade e de fraude à licitação com o possível envolvimento de agentes políticos, servidores e empresários responsáveis pelos serviços de manutenção de iluminação pública em São Gonçalo.

Laudo do MP

No recurso, a defesa sustentou a ocorrência de diversas nulidades no trâmite processual, como a sonegação de provas apreendidas na deflagração da operação. Alegou ainda que o Ministério Público do Rio de Janeiro, após oferecer a denúncia, instaurou procedimento paralelo de investigação para instruir a ação penal.

Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, quando é autorizada a realização de busca e apreensão, deve ser assegurado à defesa do acusado o acesso à íntegra dos dados obtidos – o que não ocorreu no caso.

O magistrado destacou que, embora a diligência tenha sido anterior ao recebimento da denúncia, com apresentação de relatório pela autoridade policial, posteriormente foi feito outro relatório pelo Ministério Público, com conteúdo diverso.

“Boa parte do conteúdo que foi analisado em razão da busca e apreensão só foi levada a conhecimento do juízo natural da causa e da defesa dos acusados muito depois de iniciada a instrução processual, visto que a primeira audiência ocorreu quase nove meses antes da juntada aos autos do laudo pericial confeccionado pela área técnica do Ministério Público estadual”, acrescentou.

Dados para a defesa

Para Schietti, embora as instâncias ordinárias tenham considerado que todos os elementos das mídias eletrônicas apreendidas foram inseridos nos relatórios da polícia e do Ministério Público e juntados à ação penal, ficou comprovado que não se concedeu aos advogados do ex-prefeito a possibilidade de analisarem a totalidade do conteúdo dos materiais apreendidos, para a verificação da eventual existência de outros dados que pudessem ter importância para a tese de defesa.

“O comportamento do titular da ação penal, com o respaldo judicial, de privar a defesa do acesso à integralidade dos elementos probatórios, compromete a idoneidade do processo – como espaço civilizado, ético e paritário de solução de uma controvérsia penal – e afeta, significativamente, a capacidade defensiva de, no momento oportuno, refutar a acusação e produzir contraprova”, observou.

Segundo o ministro, o Ministério Público não pode escolher, em meio ao material que embasa a acusação, aquilo que será disponibilizado para o réu, “como se a ele pertencesse a prova”.

Interesse comum

“As fontes e o resultado da prova são de interesse comum de ambas as partes e do juiz (princípio da comunhão da prova). A prova não se forma para a satisfação dos interesses de uma das partes, sobretudo daquela que acusa. Se esta obtém, via mandado judicial, uma diversidade de documentos e materiais supostamente contrários ao interesse do acusado, não lhe é lícito o comportamento de privar este último do acesso a todo esse material, até para que se certifique de que nada há nele que possa auxiliar sua defesa”, afirmou.

A jurisprudência do STJ, de acordo com o ministro, não aceita a declaração de nulidade de ato processual se a irregularidade não foi suscitada em prazo oportuno e não houve prova de efetivo prejuízo para a parte (artigo 563 do Código de Processo Penal).

No caso, porém, Schietti observou ter ficado demonstrado que a defesa, desde o início da ação, postulou o acesso a todo o material apreendido, o que permite a anulação do processo desde o ato de recebimento da denúncia. Em tais circunstâncias – acrescentou –, o prejuízo à defesa é inerente ao próprio vício constatado no processo.

Leia o voto do relator.

Fonte: STJ

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Coronavírus/Covid19 Notícias de última hora STF

STF permite que estados e municípios vetem cultos e missas durante a pandemia

O STF manteve por 9 votos a 2 a decisão do ministro Gilmar Mendes de permitir que estados e municípios proíbam a realização de celebrações religiosas presenciais como forma de conter o avanço da pandemia da Covid-19.

Com isso, na prática, o plenário da corte derruba a decisão do ministro Kassio Nunes Marques que liberava missas e cultos e afirmava que “o veto de governadores e prefeitos a esses eventos era inconstitucional”.

Ao votar nesta quinta-feira (8), Kassio informou que irá ajustar sua decisão ao entendimento firmado pelo plenário. Os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Luiz Fux votaram para que prevaleça a decisão de Gilmar. O ministro Dias Toffoli, por sua vez, acompanhou a posição de Kassio. O voto dele foi considerado uma surpresa.

A decisão não obriga gestores estaduais e municipais a proibirem cultos e missas, mas declara que decretos nesse sentido são permitidos e não violam a Constituição.

No sábado passado (3) Kassio atendeu um pedido da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos) e invalidou decretos de alguns municípios que vetavam a realização de atividades religiosas coletivas. O ministro estendeu sua decisão a todo o país.

Dois dias depois, porém, Gilmar rejeitou ação do PSD contra decreto de São Paulo com o mesmo teor e mandou duros recados ao colega que liberou os eventos religiosos. “Quer me parecer que apenas uma postura negacionista autorizaria resposta em sentido afirmativo”, disse.

O presidente da corte, Luiz Fux, então, remeteu o tema ao plenário. O julgamento foi iniciado na quarta-feira (7) e retomado nesta quinta (8). Antes de Kassio, primeiro a votar começar a falar, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu a palavra e tentou apaziguar a relação com Gilmar, que criticou o fato de a Procuradoria ter afirmado que ele não poderia ter tomado a decisão sobre o tema porque não deveria ser o responsável pelo caso.

Aras anunciou a retirada da questão de ordem que visava discutir qual magistrado teria atribuição de relatar o tema.

Logo depois, Kassio defendeu a realização de missas e cultos com regras de distanciamento e disse que o veto a esses eventos viola a Constituição. O magistrado reclamou das críticas recebidas pela liberação de eventos religiosos e disse que foi chamado por parte de mídia, de maneira injusta, de “negacionista, insensível e até mesmo genocida”

Kassio afirmou que o vírus se espalha em bares e festas e que as celebrações religiosas não são culpadas pelo alastramento da Covid-19. O ministro questionou se prefeitos e governadores poderiam determinar o fechamento de veículos de imprensa e disse que a liberdade religiosa dever ter o mesmo tratamento.

Alexandre de Moraes divergiu do colega, citou os números da pandemia no Brasil e disse que parece que “algumas pessoas não conseguem entender o momento gravíssimo que o país vive”. O magistrado também criticou a atuação de advogados após o representante da Associação Centro Dom Bosco da Fé e Cultura, Taiguara Souza, pedir a palavra para fazer um desagravo a Kassio Nunes Marques

“O respeito ao tribunal vem faltando desde ontem. Os advogados têm todo o respeito do tribunal, nós ouvimos com atenção as sustentações orais, agora espero que aguardem o julgamento. Porque isso não é jogo de futebol para se falar no momento que queira”.

Edson Fachin, por sua vez, aproveitou o voto para mandar recados ao presidente Jair Bolsonaro. “Inconstitucional não é o decreto que na prática limita-se a reconhecer a gravidade da situação. Inconstitucional é não promover meios para que as pessoas fiquem em casa, com o respeito ao mínimo existencial. Inconstitucional é recusar as vacinas que teriam evitado o colapso de hoje”, disse.

Roberto Barroso foi na mesma linha e afirmou que o Brasil parece enfrentar a pandemia com “improviso, retórica e dificuldade de lidar com a realidade”. O ministro se disse impressionado com o fato de o governo federal não ter montado um comitê com os principais especialistas na área do país para elaborar medidas de enfrentamento à doença.

Já Rosa Weber afirmou que decretos que vetam os cultos e missas são aceitáveis no “específico contexto” atual. A magistrada afirmou que “negar a pandemia ou a sua gravidade não fará com que ela magicamente desapareça”.

Cármen Lúcia afirmou que a religião é “forma de vida e não se empenha na morte – e esta pandemia mostra isso, essa doença mata”, afirmou.

Ricardo Lewandowski afirmou que, “tendo em conta a impressionante cifra de mais de 4 mil óbitos ocorridos nas últimas 24 horas, não há como deixar de optar pela prevalência do direito à vida, à saúde e à segurança sobre a liberdade de culto, de maneira a admitir que ela seja pontual e temporariamente limitada até que nós nos livremos desta terrível pandemia que assola o país e o mundo”.

E Marco Aurélio disse que não há a necessidade de abertura de templos e igrejas. “Se queremos rezar, rezemos em casa”, sugeriu.

Último a votar, Luiz Fux afirmou que estudos apontam locais fechados em que pessoas conversam e socializam por longo período como não recomendáveis nesse momento da pandemia e citou que eventos religiosos estão incluídos nessa lista. “A fé não é cega, presta deferência à ciência. É momento de deferência à ciência”, disse.

Fonte: Espaço Vital

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STF: Gilmar proíbe cultos religiosos em SP durante crise da Covid-19

A lei deve proteger os templos e não deve interferir nas liturgias. A não ser que algum valor constitucional concorrente de maior peso imponha conclusão diversa. Com esse entendimento, o ministro Gilmar Mendes decidiu, nesta segunda-feira (5/4), proibir cultos religiosos no estado de São Paulo durante a epidemia de Covid-19, no âmbito de uma arguição de descumprimento de preceito fundamental.

A decisão de Gilmar vai no sentido oposto de uma outra decisão monocrática, do ministro Nunes Marques, que aceitou pedido de uma associação de juízes evangélicos e suspendeu o veto aos cultos. Nunes Marques afrontou diretamente uma decisão do Plenário que já tinha determinado que a entidade não tinha legitimidade para apresentar ao Supremo ações de controle concentrado de constitucionalidade.

A ADPF (811) em que Gilmar decidiu pela proibição foi proposta pelo Partido Social Democrático (PSD), que impugnou normas de um decreto do estado de São Paulo (Decreto 65.563/21). Partidos políticos, ao contrário da associação de juristas evangélicos, têm legitimidade para propor esse tipo de ação.

A legenda alegou que o ato normativo restringiu totalmente o direito constitucional à liberdade religiosa e de culto, sob a justificativa de enfrentamento da crise sanitária. 

De acordo com o partido, mesmo que seja uma medida em prol do direito coletivo à saúde, a proibição total seria desproporcional. O PSD afirma que a proteção à saúde não tem peso maior que a liberdade religiosa, já que outras liberdades fundamentais, como o direito ao trabalho, não foram totalmente restringidas.

Tanto a Advocacia-Geral da União quanto a Procuradoria-Geral da República se manifestaram nesse processo defendendo os cultos: a AGU argumentou que qualquer restrição de direito fundamental no contexto de enfrentamento à pandemia de Covid-19 deve estar amparada em fundamentação técnica idônea e respeitar os requisitos da proporcionalidade, razoabilidade e a jurisprudência do Supremo.

Já para a PGR, além de a Constituição assegurar a liberdade religiosa, a assistência espiritual é essencial para muitas pessoas enfrentarem a pandemia. Portanto, igrejas e templos devem poder abrir, desde que respeitados os protocolos sanitários para evitar a disseminação da Covid-19.

Gilmar Mendes destaca que a Constituição prevê a hipótese de reserva legal ao exercício dos cultos religiosos. O inciso VI do artigo 5º da Carta assegura diz ser “inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

“(…) O Decreto do Estado de São Paulo de alguma maneira impede
que os cidadãos respondam apenas à própria consciência, em matéria religiosa? A restrição temporária de frequentar eventos religiosos
públicos traduz ou promove, dissimuladamente, alguma religião? A interdição de templos e edifícios equiparados acarreta coercitiva conversão dos indivíduos para esta ou aquela visão religiosa? Certamente que não”, diz o ministro em sua decisão.

A decisão de Gilmar também faz menção à decisão tomada pelo Plenário do STF, no âmbito da ADI 6.341, segundo a qual todos os entes da federação têm competência para legislar e adotar medidas sanitárias voltadas ao enfrentamento da pandemia de Covid-19. Para ele, o decreto paulista está em consonância com essa jurisprudência do Supremo.

“(…) É patente reconhecer que as medidas de restrição à realização de cultos coletivos, por mais duras que sejam, são não apenas adequadas, mas necessárias ao objetivo maior de realização da proteção da vida e do sistema de saúde”, conclui o ministro.

Ao negar a medida pleiteada pelo PSD, Gilmar Mendes submeteu sua decisão a referendo do Plenário da Corte. Luiz Fux, presidente do Supremo, pautou o caso para a sessão desta quarta-feira (7/4).

Conselho Ilegítimo
Outra ADPF (810), proposta pelo Conselho Nacional dos Pastores do Brasil, também impugnou a norma do decreto paulista. Mas a petição foi liminarmente indeferida por Gilmar Mendes, para quem o conselho não tem legitimidade ativa para propor ação de controle concentrado de constitucionalidade.

ADPF 810 (proposta pelo Conselho Nacional dos Pastores do Brasil)
Clique aqui para ler a decisão

ADPF 811 (proposta pelo PSD)
Clique aqui para ler a decisão

Fonte: STF

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Advocacia Direito Civil Processo Civil STJ

Indenização do DPVAT é impenhorável como o seguro de vida, decide Quarta Turma

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que os valores pagos a título de indenização pelo seguro DPVAT aos familiares da vítima fatal de acid​ente de trânsito gozam da proteção legal de impenhorabilidade prevista no artigo 649, inciso VI, do Código de Processo Civil de 1973, que corresponde ao artigo 833, inciso VI, do CPC/2015. Para o colegiado, tal modalidade indenizatória se enquadra na expressão “seguro de vida”.

A turma julgou recurso interposto pela esposa de segurado falecido contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que considerou o artigo 649 do CPC/1973 inaplicável ao DPVAT, pois esta modalidade de seguro não teria caráter alimentar, mas indenizatório – diferentemente do seguro de vida e do pecúlio, conforme expressa previsão legal.

No recurso, a viúva sustentou que o DPVAT, de cunho eminentemente social, é um seguro de danos pessoais, tal como o seguro de vida, com natureza obrigatória e a finalidade de amparar vítimas de acidentes causados por veículos automotores terrestres.

Mesmo gênero

Em seu voto, o relator do processo, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que, de fato, um dos objetivos da indenização paga pelo DPVAT é minimizar os efeitos que a morte da vítima pode causar na situação financeira da família, o que revela sua natureza alimentar.

Dessa forma, segundo o magistrado, há uma similaridade do instituto com a indenização paga em razão do seguro de pessoa, previsto no artigo 789 do Código Civil de 2002. “Ouso afirmar que tanto um quanto o outro (seguro de pessoa e seguro DPVAT) são espécies do mesmo gênero, que a lei processual teria unificado sob o singelo título ‘seguro de vida'”, declarou.

“Não se trata, pois, de aplicação analógica do dispositivo legal, senão do enquadramento do seguro DPVAT dentro da previsão contida na lei processual”, acrescentou o relator.

Ele ressaltou que o fato de o DPVAT ter caráter obrigatório – ao contrário do que ocorre no seguro de pessoa – não implica mudança substancial em sua natureza, “tampouco na qualidade e finalidade da respectiva indenização”.

Reformulação

Antonio Carlos Ferreira lembrou ainda que, embora o seguro obrigatório tenha sido originalmente concebido sob a ótica da responsabilidade civil do proprietário do veículo, houve uma reformulação em 1969 – aprimorada em 1974 – que afastou essa característica da indenização.

Segundo o relator, após aquela reformulação, é possível observar “enfoque para a proteção de danos pessoais, sem exame sobre a culpa do agente causador do dano, aproximando-se ainda mais do seguro de vida (ou de pessoa) disciplinado pela lei civil”.

Leia o acordão. ​